quinta-feira, 31 de março de 2011

Amor, só, não basta.

Casamento, por Arthur da Távola




......Aos casados há muito tempo, aos que não casaram, aos que vão casar, aos que acabaram de casar, aos que pensam em se separar, aos que acabaram de se separar, aos que pensam em voltar...

Por mais que o poder e o dinheiro tenham conquistado uma ótima posição no ranking das virtudes, o amor ainda lidera com folga.

......Tudo o que todos querem é amar. Encontrar alguém que faça bater forte o coração e justifique loucuras. Que nos faça entrar em transe, cair de quatro, babar na gravata. Que nos faça revirar os olhos, rir à toa, cantarolar dentro de um ônibus lotado. Tem algum médico aí???

......Depois que acaba esta paixão retumbante, sobra o que?

O amor. Mas não o amor mistificado, que muitos julgam ter o poder de fazer levitar. O que sobra é o amor que todos conhecemos, o sentimento que temos por mãe, pai, irmão, filho. É tudo o mesmo amor, só que entre homem/mulher (amantes) existe sexo. Não existem vários tipos de amor, assim como não existem três tipos de saudades, quatro de ódio, seis espécies de inveja.

......O amor é único, como qualquer sentimento, seja ele destinado a familiares, ao cônjuge ou a Deus.

......A diferença é que, como entre marido e mulher não há laços de sangue, a sedução tem que ser ininterrupta. Por não haver nenhuma garantia de durabilidade, qualquer alteração no tom de voz nos fragiliza, e de cobrança em cobrança acabamos por sepultar uma relação que poderia ser eterna.

......Casaram. Te amo pra lá, te amo pra cá. Lindo, mas insustentável.

......O sucesso de um casamento exige mais do que declarações românticas.

......Entre duas pessoas que resolvem dividir o mesmo teto, tem que haver muito mais do que amor, e às vezes nem necessita de um amor tão intenso.

......É preciso que haja, antes de mais nada, respeito. Agressões zero.

......Disposição para ouvir os argumentos alheios. Alguma paciência... Amor, só, não basta.

......Não pode haver competição. Nem comparações. Tem que ter jogo de cintura para acatar regras que não foram previamente combinadas.

......Tem que haver bom humor para enfrentarem imprevistos, acessos de carência, infantilidades. Tem que saber levar. Amar, só, é pouco.

......Tem que haver inteligência. Um cérebro programado para enfrentar demissões inesperadas, contas pra pagar, tensões pré-menstruais, rejeições.

......Tem que ter disciplina para educar filhos, dar exemplo, não gritar.

......Tem que ter um bom psiquiatra. Não adianta, apenas, amar. ......Entre casais que se unem visando à longevidade do matrimônio tem que haver um pouco de silêncio, amigos de infância, vida própria, um tempo pra cada um.

......Tem que haver confiança.

......Uma certa camaradagem, às vezes fingir que não viu, fazer de conta que não escutou. É preciso entender que união não significa, necessariamente, fusão.

......E que amar, 'solamente', não basta.

......Entre homens e mulheres que acham que o amor é só poesia, falta discernimento, pé no chão, racionalidade. Tem que saber que o amor pode ser bom, pode durar para sempre, mas que sozinho não dá conta do recado.

......O amor é grande mas não é dois. É preciso convocar uma turma de sentimentos para amparar esse amor que carrega o ônus da onipotência.

......O amor até pode nos bastar, mas ele próprio não se basta.

......Um bom amor aos que já têm!

......Um bom encontro aos que procuram!

......E felicidades a todos nós!

terça-feira, 22 de março de 2011

Sim, ela estremeceu quando os olhos se encontraram.
Havia muito tempo que havia calado seu olhar - o que de nada adiantou.
Sim, ela reconhecia o seu próprio olhar e apesar de não ser capaz de flagrar-se olhando para si mesma, conseguia sentir o quão profundo e penetrante eles a miravam naquele momento.
Pediu um café e virou, tomando como se fosse um shot de whisky cowboy. 
Era uma fatia do passado roubando-lhe o presente e era doce e angustiante ao mesmo tempo.
As mesmas dores, o mesmo afeto, as mesmas decepções. Já passara tanto tempo sem que contudo ela conseguisse apagar aquele olhar de seu carinho.
Sim, ela reconheceu a situação e parecia que estava mordendo o próprio rabo, infinito.
Pensou em sua sala, em seu divã. No cigarro que nunca apagara, pois a chama sempre se mantinha acesa dentro dela - tinha essa terrível capacidade de amar para sempre que insistia em acompanhá-la de tempos em tempo. Um dia fora generosa, mas aquilo tinha sido há muito tempo, decidira se esquecer desse capítulo.

Chorou toda a dor do mundo em silêncio. Desejara ela parir Tróia , enfrentar Capadócia. E seus dragões.
Pediu mais uma dose de café. A situação agora parecia mais perigosa, pois seu olhar de tristeza fora captado e ela era orgulhosa demais para reconhecer sua fraqueza.
Ela era a criança que amava em silêncio. Ela era a mulher que gritava aos quatro ventos o seu desejo.
Tomou o segundo trago e por um instante era Terezinha de Chico. Ele era o segundo.

O tempo passou. Ela olhou para trás e percebeu que nada poderia ser modificado. Tentou mudar a música em vão, pois os dançarinos não se moveram.

Quem era ela nunca saberia, pois as lágrimas haviam borrado a máscara. Kabuki. Só conhecia seu íntimo, e ela reconhecera seus oponentes. Já vivera a mesma vida em outra vida. Um eterno retorno.

P.S. Ela não conseguiu datar o texto, não tinha sequer certeza se ele não era apenas parte de sua fantasia.

terça-feira, 15 de março de 2011

Era uma historia que começava no desepero e foi através do tratamento que a relação se tornou amizade.
Por serem amigos, se curaram mutuamente, ainda que sem perceberem.
A amizade foi esquecida e emnora fossem amigos, eram estranhos a partir do fim.
Despediram-se num silencioso abraço, onde todas as dores gritaram e saltaram de seus corpos, libertando-os da solidão.